sábado, 13 de fevereiro de 2010

No quarto com Marina

Um ritual me acometia diariamente no final de 1984. Passada a meia-noite, eu acertava a sintonia 93,9 Mhz no aparelho três-em-um e passava a percorrer o quarto escuro à espera de uma música.

A rádio Capital FM não ocupava a ponta de cima da audiência. Longe do assédio das gravadoras, creio que recorria àquela faixa, naquele fim de programação, por gosto da locutora, a Cibele (que eu nunca conheci). Me Chama já era sucesso na voz de Lobão, seu autor, mas o meu travesseiro era ouvi-la no canto de Marina Lima que, durante três minutos, causava algo mágico no escuro do meu quarto.

"Aonde está você/me telefona/me chama”

Não tinha porque esperar o chamado. A menina com quem eu sonhava sequer tinha o meu telefone. Apesar da melancolia de "tá tudo cinza sem você/tá tão vazio”, a canção nunca me despertou uma “lágrima no escuro”. Naquele verão, ouvir Marina era crer na primavera que em alguma manhã, talvez na próxima, me chegaria.

Marina já me apaixonou em várias canções (Me Chama nem é a melhor levada dela). E, como na rotina de qualquer casamento (incluindo os meus com os meus mitos), ela me aborreceu não poucas vezes. Mas não peço divórcio: sei que volto para ela.

Não tenho vontade de retornar àquele quarto (continuo na mesma casa). Me Chama, às vezes, toca no rádio sem aviso prévio. E ainda é uma mágica que surge à minha procura, como um raio de sol pessoal e intransferível, iniciado com “Chove lá fora e aqui...

Um comentário:

Carla Scheffer disse...

Sensível, poético e por que não dizer, ffffoffffo!!!!