segunda-feira, 5 de abril de 2010

À festa com Helena e Maria Lucia

Falo aqui sobre cinco minutos que me são tão fundamentais quanto o oxigênio: o encontro de Helena Ignez e Maria Lucia Dahl em Cara a Cara, de 1967. É o primeiro filme do Julio Bressane, escandalosamente bem falado, fotografado, musicado, montado, silenciado...

Inicialmente, as belas se animam por uma festa. Em seguida, vestem trajes de época, num belo jardim, tendo a companhia de um amigo (João Paulo Adour). Aqui, há uma leveza de Jules e Jim às avessas evocando o cinema mudo: além da ausência de fala, joga-se com caras (ambas olham pra mim, tal como Anna Karina nos filmes de Godard), bocas e passos ligeiros, como num curta-metragem do Lulu de Barros dos anos 20.

Creio ter visto tal seqüência umas 800 vezes porque me fixei na idéia de “ir à festa”. Ou seja, encontrei os meus heróis, os determinados que vão à festa.

Sou tão apegado a Cara a Cara, que sequer empresto a fita por não querer ver minhas musas dormindo fora de casa... De tanto ver o encontro, acabei tomando parte nele, pois conheci as duas (incrível: Maria Lucia e eu fazemos aniversário no mesmo dia).

Passa de vez em nunca no Canal Brasil e tem outros pontos brilhantes:

1) o político (Paulo Gracindo) discursando para um plenário vazio (o canto sem letra de Maria Bethânia é a trilha que detona a necessidade de um grito).

2) a dificuldade de comunicação: Luciana (Helena) e seu namorado (Paulo Padilha) se encontram numa praça e sentam um em cada canto.

3) o nervosismo dos poderes político e religioso reunidos num terraço. Aqui, o cenário e o passeio da câmera lembram Terra em Transe, o que talvez explique porque Cara a Cara é pouco citado. Mas na ponte Glauber Rocha-Julio Bressane o discípulo sai-se melhor do que o mestre.

4) o desgosto no rosto do frustrado burocrata (Antero de Oliveira) que cuida da mãe doente (Vanda Lacerda) e sonha com uma bela garota (Helena).

Bressane tem dois rostos: o angustiado (Antero) e o animado (João Paulo). Eu sou o segundo, o que vai à festa com a Helena e a Maria Lucia!

*****

Ayrton Baptista Junior, janeiro de 2005

Um comentário:

Carla Scheffer disse...

Muito bom, amigo! Vc é tão...tão...tão...